Lembrando que,não estou jugando vocês por jogarem muito.
“Olha, esse Minecraft deixa as crianças loucas, né”, me disse a publicitária Giovana*, rindo, numa tarde recente. Ela é mãe do Igor*, de 11 anos, um aficionado pelo game. A família paulistana tem três computadores em casa e dois deles ficam à disposição do garoto, que mantém um olho no jogo e outro nos canais de dicas do YouTube. Todas as tardes e noites ele joga com os amigos ligados no Skype enquanto a mãe, de ouvidos atentos, permanece atrás. As sessões duram várias horas e, não fosse a supervisão materna, não teriam fim.
Igor começou a jogar Minecraft aos cinco anos. Viciou mesmo. Aos sete, ele virava noites no joguinho. Preocupada, a mãe monitorava de perto o Facebook do filho. Ela via que o menino recebia mensagens às quatro horas da manhã dos colegas perguntando se ele estava online no game. O limite que a fez procurar ajuda foi quando Igor, aos oito anos, não saía da frente do computador nem para ir ao banheiro e sofria alguns acidentes sentado na cadeira em frente à tela. (Ele se cagava todo, digamos assim.)
Exceto pelos detalhes escatológicos, a situação de Igor é parecida com a de Nicolas, de nove anos, que mora em Santos, no litoral de São Paulo. Ele começou a jogar Minecraft também aos cinco. Não demorou para se viciar no game. “Ele sonhava com isso, tinha pesadelos, só queria ver coisa de jogos”, conta a pedagoga Irene, a mãe dele. A primeira solução da família foi tentar barrar o acesso, mas o menino começou a ter os comportamentos alterados e a mãe teve que mudar de estratégia. “Não o impeço de jogar porque, por mais que eu goste que ele brinque de outras brincadeiras de criança, ele tem o gosto dele”, diz Irene. "Mas agora ele só pode jogar de final de semana."
O encantamento do Igor e do Nicolas pelo Minecraft está longe de ser algo isolado. Lançado em 2009, o game de construção de bloquinhos é extremamente popular: são 50 milhões de jogadores pelo mundo e, no Guiness Book, tem um espaço dedicado somente a recordes impressionantes de tempo gasto na plataforma – o austríaco Martin Fornleitner, de 19 anos, é o recordista; em 2011, ele passou nada menos do que 24 horas e 10 minutos jogando sem parar. O game é um vício consolidado na geração de crianças e adolescentes e, embora sirva para iniciativas legais de educação, preocupa muitos pais. Afinal, não parece saudável uma criança passar mais de oito horas ao dia jogando e assistindo a vídeos de um mundo virtual, né?
De Fato não é.
O psiquiatra Cristiano Nabuco do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, que atende crianças e adultos com dependência por internet, já recebeu uma série de casos de meninos e meninas viciados em Minecraft no seu consultório. Para ele, a fixação dos mais jovens pelos bloquinhos tem a ver com a sistema de recompensa do cérebro que está se formando. “Dos oito aos dez anos, a criança começa a ter uma ideia mais clara da função dela no grupo e, nessa fase, é importante o que as pessoas dizem a respeito dela. Esses jogos sabem disso e não são ingênuos: eles dão vários pontos pro jogador e, quanto mais pontos você dá, mais você massageia o ego do jogador”, diz.
"Mamãe, eu não consigo parar"
Nabuco explica que algumas pesquisas apontam que, depois de jogar por oito minutos qualquer jogo, o cérebro começa a liberar dopamina, um neurotransmissor que aumenta a motivação. Daí é ladeira abaixo. “Quanto mais realizado o indivíduo se torna no jogo, mais precária pode começar a ser a vida real dele. O lado de lá, virtual, passa a ser mais atrativo.”