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Quando eu era criança eu costumava chorar todos os dias. Porque todos os dias eu sentia falta do meu pai. Minha avó me disse que se eu orasse todos os dias pedindo que meu pai me levasse pra morar com ele, Deus ouviria e eu não choraria mais. Orei. Orei muito. Até que aconteceu. E eu estava tão feliz por ter minha mãe e meu pai por perto todos os dias! Mas um dia aquela felicidade se transformou em um inferno de dor que até hoje eu vivo. Meu pai, deitou na minha cama e disse que iríamos brincar. Fechei meus olhos enquanto ele acariciava meu corpo, eu disse que não queria. Mas homens não entendem que não é não. Eu não me lembro se tinha sete ou oito anos. Eu me lembro que no segundo dia, ele ejaculou no meu rosto, no meu rostinho de criança e eu chorei. E todos os dias eu chorei. Eu estava tão assustada para dizer pra alguém e eu tinha tanta vergonha de mim mesma e dessa situação. Ele sempre me dava dinheiro depois, ou me deixava sair pra brincar. Eu me trancava no banheiro e chorava no chão pedindo ajuda pra Deus. E eu orei. Orei muito. Deus provavelmente não existe ou se fingiu de surdo. Eu contei pra minha mãe com onze ou doze anos de idade. Eu pensei que ela iria separar dele. Mas não. Ela contou pra minha família e ninguém nunca fez nada. Todos ignoraram a minha dor como se eu fosse nada. E continuou. Todos os dias na hora do almoço, ele me levava para dentro do quarto, trancava a porta, me deitava e eu tapava os olhos e chorava ali mesmo. Ele roubou minha infância e minha adolescência. Ele roubou minha inocência e matou minha alma todos os dias, pouco a pouco. Eu me sentia a todo tempo triste, deprimida, assustada, desesperada. Eu me sentia impura, suja, inferior as outras meninas. Então quando fiz 15 anos eu decidi que não iria mais deixar isso acontecer. Ele me levou pro quarto a força e eu disse que se ele tocasse em mim eu iria denunciar ele. Ele me agarrou pelo braço e me jogou no chão pra fora do quarto e me chamou de ingrata. Nesse dia eu me tranquei no banheiro e chorei desesperada sentada no chão com medo de que algo acontecesse com meus irmãos e minha mãe. Pois ele sempre se tornava agressivo com todos quando eu demonstrava ter força e coragem para contar a todos. Eu cortei então, todo contato com ele mesmo morando na mesma casa. Vivia fugindo, eu nunca estava em casa, eu tinha medo de dormir. Algumas vezes fui embora de casa morar com minhas avós e até pensei na posibilidade de morar na rua. Mas não importava o que eu fazia ou a onde ia, ele sempre ia atrás e me prendia naquela maldita casa com ele. Olhava pra todos os lados procurando ajuda e não achava. E todos os dias era um pesadelo, e era horrível e perturbador. Tive minha primeira crise aos 15 anos. Não conseguia parar de chorar, eu não comia e não dormia. Eu não conseguia sair da cama. Eu queria que parasse aquela dor. Mas a dor também não entende que não é não. No ano seguinte mais uma crise e ninguém fazia nada. Aos 17 anos a mesma coisa e cheguei a perder 10 kg em um mês. E assim ia. Todo ano uma crise. Aos 18 anos minha mãe me disse que eu era assim porque queria. Ela disse. E eu nunca esqueço. Em outubro de 2016 tive uma crise e tentei suícidio. Tomei trinta comprimidos de Rivotril. Me levaram para o hospital e os médicos decidiram me internar em um manicômio! Fiquei internada por quatro dias. Fui encaminhada para o CAPS (onde pessoas com sérios problemas psíquicos fazem tratamento) e comecei a ser medicada. Mas parei com os medicamentos e em abril tentei suícidio de novo. Comprei lâminas e cortei meus pulsos. Mas acordei no hospital com o medico dando pontos nos cortes. Estava tão desesperada que gritei por ajuda naquele hospital e ninguém mais uma vez fez nada. Eles só me olhavam com cara de dó. Até que dois dias depois tive o apoio que precisava por parte da minha tia. Ela conversou com o delegado e me orientou. No mesmo dia fui à delegacia da mulher. As vezes que tentei me matar foram horríveis porque me sentia sem nada, um nada, e sentia tanta dor dentro de mim que não sentia a dor dos cortes. Eu preciso de remédios para dormir toda noite e todo dia é difícil sair da cama, é difícil sair lá fora. E mais difícil ainda é lembrar que ninguém me ajudou quando eu gritava por ajuda. Ninguém ouviu, ninguém se importou. Pelo menos é assim que sinto. Deixaram que eu chegasse nesse ponto em que estou hoje. Minha vida é triste todos os dias, eu não posso nem ter um relacionamento saudavel ou um emprego porque sou doente. E essa doença me dá vontade de morrer todos os dias. Eu não tenho esperanças que eu me cure da depressao. Eu tenho esperança que a dor amenize e eu possa viver normalmente. E eu não quero que nenhuma outra menina viva isso ou sinta isso. Embora eu saiba que muitas vivem isso, eu não quero. E eu escrevi esse texto para tentar ajudar de algum jeito as vítimas de abuso, que vivem o que vivi por sete ou oito anos da minha vida. Você é forte menina! Você é muito forte então se levante e não se esconda. É o seu corpo e é você quem decide quem o toca. Se ninguém te ajuda, ajude a si mesma. Você é linda e é digna de amor.
Atualmente minha mãe está casada com outro homem. Meu pai não está preso e não tenho contato com ele. Meus irmãos estão tendo um pai pela primeira vez e eu estou muito longe deles tentando ficar bem sem que minha irmã sofra mais por ver assim.
É a minha maldita história para este maldito mundo. Não se calem.
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Eu não sou uma menina, e não posso imaginar, se quer por um segundo como é a sensação de sentir isso, mas, eu posso ajudar a deter e a fazer com que pessoas como essas não se calem, se levantem e que apesar de tudo, ela não está sozinha...
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- T u m b l r -