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É possível que muita gente já tenha ouvido falar de Charles Bukowski, embora desses, poucos de fato o tenham lido. Mas quem é Bukowski? Um ícone da contra-cultura? Um escritor maldito cult? Um charlatão literário posando de revolucionário? No próprio livro, quando certa vez questionado por uma editora de uma revista literária ele responde sem firulas: "sinceramente, nem eu mesmo sei."
As escrituras de Charles Bukowski encantam pelo excesso de loucuras e desajuste social que compõe a trajetória e formação do escritor. Sua literatura, mesmo que desleixada, escrita sem o mínimo de cautela com o estilo ou com a escrita formal tradicional, é de uma natureza suja e vulgar, porém, sincera e honesta.
Ler Bukowski é entrar em um universo totalmente diferente, ele é mordaz, é louco, é lúcido.
É difícil comparar autores, principalmente quando eles apresentam vozes originais, descoladas de tantas fórmulas mercadológicas que formatam a literatura de “fácil” digestão. Ainda assim, é possível reconhecer que Bukowski transita na mesma faixa que (talvez) Rubem Fonseca e (certamente) Reinaldo Moraes, só pra ficar nos brasileiros. A grande questão é que no caso do americano, a notoriedade que o cerca, parece ser o componente essencial na apreciação de seu trabalho. Não cabe críticas ou questionamentos.
Embora não seja propriamente um ícone do movimento, ele é bastante identificado com a chamada geração beat e inspiração permanente para novos autores que tematizam essa mesma esfera. Tais credenciais são fatores incontestáveis da qualidade de sua literatura, no entanto, há de se descontar o encantamento gerado pela figura que, em muitas ocasiões, influencia a justa avaliação da obra. Parece ser o caso de “Notas de um velho safado”.
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Charles Bukowski
Charles Bukowski nasceu na Alemanha em 1920, filho do soldadoteuto-americano Heinrich Bukowski e de Katharina (nascida Fett), mas ainda criança mudou-se para os Estados Unidos com seus pais. Foram inicialmente para Baltimore em 1923, depois para o subúrbio de Los Angeles e tornou-se escritor. Bukowski faleceu de pneumonia, decorrente de um tratamento de leucemia aos 73 anos, em 9 de Março de 1994, na cidade de San Pedro, Califórnia. Com o tempo, apareceram alguns herdeiros seus na literatura, principalmente na questão do estilo violento e despudorado de sua linguagem, e que acabou inclusive tendo desdobramentos no cinema. Mas poucos são aqueles que, como ele, vivenciaram e permaneceram com naturalidade na sarjeta, fazendo dela sua fonte de inspiração. De todo aquele inferno imundo e fedido, Bukowski fez o seu paraíso.
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SINOPSE
ㅤEm 'Notas de um velho safado' a América tem uma cara de 50 anos, corpo de 18 e desfila de calcinha rosa claro e salto alto na madrugada corrosiva de Los Angeles. A América é um sapatão furioso com uma garra metálica no lugar da mão esquerda e não quer saber de transar com o Velho Safado. A América é uma deusa milionária com a qual ele se casa e da qual amargamente se separa. A América é uma prostituta, 150 quilos, um metro e meio de altura, que peida, uiva e destroça a cama quando goza. A América é também estudantes e revolucionários proferindo discursos inflamados em parques ensolarados de São Francisco no final da década de 60. A América é Neal Cassady dirigindo alucinadamente pelas ruas de Los Angeles, pouco tempo antes de morrer de overdose sobre os trilhos de uma ferrovia mexicana. A América é Jack Kerouac e Bukowski poetando na Veneza californiana. 'Notas de um velho safado' forma um conjunto de histórias excepcionais saídas de uma vida violenta e depravada, horrível e santa. Não podemos lê-lo e seguir sendo os mesmos.
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Resumo
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O livro é uma espécie de cardápio da verdadeira geléia geral em que consiste sua obra, tão alcoólica, sexual e escatológica. Um livro que convida à reflexão. Afinal, é o bom e velho Buk, sendo e falando como ele mesmo, mas levantando questões e divagando sobre assuntos complexos e profundos da sociedade e das relações humanas. Ao leitor desavisado, a primeira impressão é de caos. As fronteiras de gênero não são nítidas, o que sugere um grande quebra cabeça a ser montado a cada "nota". A saga errática de bebedeiras e farras, intercaladas com uma ou outra grande sacada, formam a matéria prima básica de “Notas de um Velho Safado”. Para os leitores habituais ou admiradores de longa data, o livro é uma afirmação da excelência de sua produção. Já, para aqueles que se aventuram pela primeira vez no submundo do velho Buk, a heterodoxa desorganização de seus escritos não ajuda muito. O fato dos contos, ou capítulos, a depender do critério do leitor, não apresentarem qualquer tipo de título e identificação, reforça essa sensação de estranhamento.
Os contos de um velho safado vão se desenrolando com uma narrativa as vezes bruta, e outras tão contidas que nos faz imaginar que a loucura dos poetas nos diz tudo o que não seria dito em outra forma, contos meio biográficos e outros de ficção dura que nos faz imaginar um grande filósofo por traz da carapaça desmedida em palavras que até nos choca mas que de tão real nos cativa.
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- Opinião pessoal
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ㅤ"Notas de um Velho Safado" talvez seja um dos livros mais puros da literatura contemporânea que eu já tive o prazer de ler. Aparentemente sem esforços mentais ou algo do gênero, a compilação dos textos é uma mistura do que se pode imaginar que seja o cotidiano de uma mente anormal: bebedeiras, mulheres, escatologia, ressacas, suicídios, sangue e uma singela dose de violência doméstica. É bom saber que ainda é possível se encontrar perdido por aí textos "podrões" escritos de maneira relapsa, porém que cause horror, espanto, risos e reflexão. Tentei ler as linhas e o que há por trás da cortina dos vocabulários chulos que Bukowski emprega. E quanta coisa há! O vocabulário assim, meio "sujo", realmente não me desagrada. Pelo contrário. Mas em contra partida sentia um asco ao ler como ele se refere às mulheres em suas notas. Sejam elas autobiográficas ou não (É difícil classificar se é fictício ou não, já que o uso do alter-ego dele é inconsistente, para dizer o mínimo. Não que isso importe). O recurso linguístico, ou melhor, a falta dele, também não me incomodou. Sou amante das licenças poéticas e da livre criação. E também adorei o fato do Bukowski não ser estático. Ora era ele quem nos falava e na outra era ele o personagem. Uma dança literária que nos prende e nos faz raciocinar sobre quem é quem ali naquele conto.
Seus poemas têm profundidade, mas a linguagem simples torna acessível. O uso de humor, metáforas e escárnio arrogante formam uma espinha dorsal sólida para a maioria de seus trabalhos. Há uma nuvem de tristeza e pessimismo sobre ela que eu acho fresca. A literatura de Bukowski é algo belo surgindo em meio à imundície e fedor. Assim é Bukowski: sujo e sincero, podre e belo. Pode ser tudo, menos chato e previsível. Em suma é isso, notas de um velho safado é Bukowski puro, é um livro que coloca o dedo na ferida e cutuca o leitor até o osso. Apreciem o velho Buk, sem moderação.